quarta-feira, 7 de abril de 2010

Um vestido discreto

Mais um trecho do conto Um vestido azul, agora com título novo:

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"A sala ficou enorme, eu via as garotas cada vez mais distantes. Olhava nervosa um relógio na parede, pois o horário da festa se aproximava e eu não tinha roupa. Nisso a zeladora da escola se aproximou, num guarda-pó azul claro. “Você está chorando?”, ela perguntou. Eu soluçava. “Venha comigo”, ela disse. “Eu vou te ajudar.”

A zeladora foi puxando minha mão. Era gorda, tinha a pela macia e quente. “Não se preocupe”, dizia. “Conheço a melhor costureira do mundo.”

Chegamos a um prédio baixo de seis andares, no condomínio onde morei quando criança. Eu olhava admirada: “Nada aqui envelheceu. Está tudo limpo e bem cuidado”.

Ainda de mãos dadas, subimos uma escada longa, com degraus baixos e fáceis de subir. A zeladora tinha um rosto diferente, estava mais magra e bronzeada, eu imaginava que o exercício tinha feito bem a ela. Finalmente chegamos a um apartamento sem portas nem paredes. Todo aberto, podíamos ver a sala, a cozinha, os banheiros.

No canto da sala, uma menina fazia um longo colar com grãos de arroz que pareciam pérolas. Eu me sentia ainda mais admirada. “Nunca pensei que arroz brilhasse tanto.” No seu colo havia botões, balas de goma e chaveiros, e eu me perguntava: “Nossa, como ela fará tudo combinar?”.

De repente aparecia na sala um homem baixo, muito magro, com os cabelos cobertos por um lenço vermelho. Ele segurava um pano de prato, secando xícaras de café.

A zeladora havia desaparecido. Eu me aproximei do homem e disse: “Preciso de um vestido. Você pode me ajudar?”. Notei que ele tinha as unhas pintadas de lilás."

3 comentários:

Anônimo disse...

gostei desse texto. :)

Paulodaluzmoreira disse...

Eu tbm. Uma mudança interessante em relação ao começo do conto, que parecia bem "pé-no-chão".

sabina anzuategui disse...

Pois é. No meio do caminho, resolvi transformar a cena de memória num sonho.