Escrevo mais um conto, agora para um projeto de minha amiga Sissi.
É inspirado numa lembrança de Marguerite Duras:
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Um vestido azul
Alguns anos atrás, trocando de canal durante a noite, assisti por acaso à entrevista de uma velha escritora francesa. Eram imagens antigas em preto e branco, a mulher teria talvez uns cinquenta anos, e isso era muita idade há algumas décadas. Ela segurava o cigarro aceso, tinha voz rouca e um rosto mal-humorado. Falou muito, movendo as mãos amplamente, mas esqueci quase tudo. Lembro apenas o que disse sobre suas roupas.
Aos quarenta anos, ela decidiu que só usaria um figurino: saia reta e blusa preta com gola rolê. Não queria mais se preocupar. Cansou de gastar suas horas pensando se estava mesmo bonita ou bem vestida. Escolheu uma imagem e seguiria a vida considerando encerrado o assunto.
A decisão extrema tinha pouca relação com as roupas. Principalmente, irritava-se com jornalistas que a descreviam sempre da mesma maneira: "além de escritora, é também uma bela mulher". Repetia variações da mesma idéia: "hoje escritora reconhecida, foi uma linda jovem durante a guerra". "Seu talento com as palavras se revela nos gestos insinuantes e femininos".
2 comentários:
gostei. é engraçado que parece que uma entrevista vai começar, que ela vai ser entrevistada. inclusive eu gostava de ler essa entrevista.
ah, eu não lembro onde li isso. talvez tenha sido uma informação solta na biografia dela.
quer dizer, a entrevista é inventada (por isso não menciono o home dela)
mas a idéia é verdadeira, embora eu não lembre os detalhes.
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