sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Espiritualmente talvez

Sexta-feira e este blog continua abandonado.

Gasto minhas horas estudando e trabalhando, a cada dia me angustio menos por escrever pouco. Escrever dessa maneira: como pintar um quadro.

Muitos anos atrás, falava com um psicanalista. Reclamava de escrever roteiros, o que diminuía meu tempo para "escrever".

Ele: Mas escrever roteiros não é escrever?

Eu: Não.

Talvez não fosse claro, mas agora penso que escrever - desse modo - é um ato sem finalidade. Um impulso que sobrevive à ausência de resultados planejáveis: não gera dinheiro, diploma, nenhum retorno imediato.

Escrevo sempre, claro, mas raramente dessa maneira.

Estranho não sentir mais angústia. O tempo diluído, o desejo latente e conformado, a ânsia enfraquecida.

Espiritualmente talvez seja bom: querer pouco, cada vez menos, sem querer.

7 comentários:

marcos disse...

tava pensando nisso agora mesmo, pq acabei de ver isso aqui

http://www.overstream.net/view.php?oid=lkmrs1iwill4

que escrever é diferente de escrever. e a palavra ser a mesma. mas é diferente, sim.

e pode ser só porque eu tenho até insônia, de tanta angústia, mas não acho que espiritualmente seja bom não tê-la. espiritualmente deve ser bom sair da angústia pro arrebatamento. diz que são joão da cruz ejaculava quando comungava com deus.

sabina anzuategui disse...

adorei o depoimento, concordo totalmente. mas quando assumi isso - ligar o taximetro, só trabalhar por dinheiro - diminui muito o interesse de quem poderia pagar (exatamente como ele diz).

quanto à angústia. existencialmente, acho impossível viver sem ela. mas quanto à escrita, sim. viver é mais difícil que escrever (desculpe o mau estilo) - questão de hierarquia.

marcos disse...

hm.

eu fico pensando, saturno que é tempo-rei (ando com mania de astrologia), qual solidez a idade traz. tomara que uma angústia sólida. mas virar folhinha ao vento, também, quem sabe?

tou é começando a me conformar que não consigo escrever profissionalmente. tento e é um fracasso. parece um paradoxo, mas só se escrever for sempre escrever. então, né. ligo o taxímetro em outro carro. todo mundo é media whore the same.

mas quanto a escrever como ato sem finalidade: o impulso te pega menos? ou é que você desencana dele com mais facilidade?

Paulodaluzmoreira disse...

Escrever com o taxímetro ligado tem seu preço para o escritor - é muito doloroso o contraste entre o amor que se tem a um trabalho e o pouco apreço que os outros têm por ele, principalmente quando há que se pagar as contas com esse pouco apreço. Mas escrever sem taxímetro significa nunca ser valorizado direito [no nosso mundo tudo que não é remunerado é visto como "brincadeira" que a gente sempre deve deixar para um "tempo livre" que às vezes só existe entre aspas]. Parece que o princípio do prazer sempre tem que se curvar ao princípio da realidade... e a gente precisa encontrar um equilíbrio mais ou menos satisfatório. Mas o equilíbrio é sempre instável... Puxa, onde foi mesmo que eu deixei aquele frasco de prozac? ;)

sabina disse...

marcos: não é que o impulso pega menos. mas antes eu me sentia culpada por aproveitar o fim de semana, em vez de ficar escrevendo metodicamente, como sacrifício à grande arte.

agora, se não sobra tempo livre no horário comercial, foda-se.

não vou trocar meu prazer momentâneo pela esperança de uma comunhão futura e incerta.

júlia disse...

eu não sei.

sou uma pirralha. pirralha e metida, nunca escrevi por taxímetro, embora na faculdade muitas vezes assim sentisse. e agora tenho um roteiro pra escrever, mas não vão me pagar, vou fazer por prazer.

como tendo a ver o fazer como um ofício, escrevo sempre profissionalmente, mesmo quando miudamente no diário que só eu vejo.

a angústia por não escrever vai e volta. passei umas semanas últimas sem ela, numa satisfação de ter feito e num esquecimento absoluto do ofício que me chama.

pra mim escrever é uma coisa que se obriga por si.

não é como fazer xixi, é como lavar as mãos.

então escrever metodicamente pra mim não existe. a não ser se for como o hábito de lavar, tantas vezes quantas necessárias, as mãos sempre sujas.

Rachel Souza disse...

Estou querendo menos também, isso é fato. Só não sei ao que atribuir exatamente, se ao mestrado ou se com questões pessoais.