Esse era um trecho do texto a que me referi no outro post.
Escrevi faz tempo. Relevem a falta de estilo.
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"Teus olhos me passam relato de fácil leitura
me revelam teus hiatos
de afeição nas aventuras.
Me contam que a velha saudade ainda te guia
não te traz felicidade
um amor a cada dia."
É esse ponto da música que me machuca. Já nos primeiros versos, três coisas soam terrivelmente pungentes a mim:
Primeiro o mais óbvio, ou talvez nem tanto: os hiatos de afeição nas aventuras. É um lugar comum hoje em dia dizer que as mulheres ultrapassaram os limites do feminismo, não têm mais delicadeza nem mistério, e atacam os homens, eles ficam assustados, e elas sozinhas e infelizes.
Eu mesma não sei se concordo com isso, acho que o problema não está nas mulheres nem no feminismo. E tampouco nos homens, mas sim nessa financeirização dos relacionamentos que já comentei acima. Se a questão não é mais amar ou não, o que pressupõe admiração, real ou idealizada, pelo outro, mas sim ter uma relação porque "um carinho às vezes cai bem", então me parece natural que as mulheres se atirem, porque elas são criadas pra resolver as coisas práticas - arrumar a casa, fazer supermercado e tal. Se no caso está faltando um homem, do mesmo modo que falta detergente ou adoçante, então é evidente que ela vá atrás de um com a mesma eficiência com que passaria no Pão de Açúcar 24 horas pra buscar um papel higiênico. Os homens, privados desse aprendizado por suas mães que faziam tudo por eles, ficam meio perdidos em tanta eficiência, não sabem direito como reagir.
Por isso a música acerta ao falar de hiatos de afeição nas aventuras. Veja que não está se falando de momentos de arrependimento, solidão ou tristeza, o que seria uma consequência óbvia desse tipo de relacionamento superficial. Pelo contrário, fala de hiatos de afeição. Se desenha uma pessoa que, mesmo vivendo a vida do seu tempo, cheia de aventuras e com pouco sentimento, ainda assim, nos hiatos, tem uma afeição verdadeira dentro de si.
Essa afeição é comprovada nos versos seguintes:
"Me contam que a velha saudade ainda te guia.
Não te traz felicidade um amor a cada dia".
Cá está o amor redentor que muda as pessoas e é tão raro - tão raro que aconteceu uma vez, no passado, por isso é descrito como "a velha saudade". Aquela velha saudade que ainda te guia, mesmo depois de tantas aventuras, mesmo depois de um amor a cada dia.
Os primeiros versos da estrofe desenham este tipo de mulher, mas colocam ainda uma segunda pessoa, o homem que observa. A música não diz "Você tem hiatos de afeição", mas sim "Teus olhos me revelam" esses hiatos.
A moça, além de ter só essa sementinha perdida de amor, além disso não fala dela, mantém guardada, em silêncio, e só seus olhos revelam isso, para quem sabe olhar. Algo que estaria estampado, pois são "relatos de fácil leitura", mas que outras pessoas não vêem, porque não querem, ou não são suficientemente sensíveis. Só uma pessoa, o cantor da múscia, é quem consegue ver. Só a ele os olhos passam e revelam esses relatos.
O que ronda esta estrofe toda é a palavra amargura, que não está nos versos, mas paira como um fantasma por ser a rima mais imediata de "leitura" e "aventura". Uma rima que não se concretiza, mas permanece ali como nuvem negra.
Um comentário:
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