quinta-feira, 10 de abril de 2008

Um motivo real

Parágrafos 13 a 17:

"As imagens começaram a surgir, nos meses seguintes, em golpes de memória - numa banca de jornal, no caixa do supermercado, em qualquer tempo morto. Eram cenas comuns, imagens que eu nunca quis esquecer, que relembraria talvez se alguém me perguntasse. Cenas que me pareciam familiares e ao mesmo tempo estranhas: porque eu poderia lembrar, mas não lembrava. Não havia esquecido, mas isso era menos importante que essa outra condição: a condição de não lembrar.

Tinha uma sensação vaga de que essas lembranças, por sua pouca importância, eram talvez mais importantes que a memória recorrente de minha vida, a história a que eu havia me acostumado. Pensei que um terapeuta poderia me ajudar. Talvez pudesse, e desisti. Quando o procurei, tinha vergonha do que iria dizer. Quando parei, senti culpa pelo que não disse.

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Algum tempo depois de interromper o tratamento, comecei a anotar as cenas. Pensei que os sentimentos ficariam no papel e minha memória se esvaziaria. Mas a falta de lógica entre as anotações me incomodava. Faltavam detalhes, eu não lembrava por que certas coisas haviam acontecido. Não queria um motivo profundo e existencial: sentia falta do motivo real, da causa imediata de cada cena.

Com muita dificuldade escrevi o que se segue. Não sei se o texto é claro, nem se está bem escrito. Apenas tentei estender minha memória até onde pude, para ser clara, ser exata, mostrar o que aconteceu no limite de minha possibilidade.

Tenho medo que tudo isso, por mais custoso que me tinha sido, ainda não explique o essencial. O sentimento que surgiu diante daquela imagem: ele e sua filha."

5 comentários:

Anônimo disse...

esse livro o qual tu tá colocando aqui os parágrafos, ainda será lançado?

(www.blogdogafanhoto.zip.net)

júlia disse...

sabina, posso fazer uma sugestão? claro que eu precisaria ler inteiro para dizer se a impressão continua, mas lendo o concatenamento todo que você colocou aqu e, especialmente a cena dele com a menina na banca de livros, acho que fica tão claro que foi essa imagem dele com a filha que suscitou todas as lembranças que esse último parágrafo me parece redundante.
um beijo.

júlia disse...

relendo, acho que eu que li mal. o sentimento se apresenta e apresentará. né?
perdones.

Anônimo disse...

Acho, achei e estou achando �timo. Nem um pouco redundante. Ali�s, vc alcan�ou a meta que buscava: sinceridade.
Parece mesmo um desabafo sincero. Estou louca pra ler tudo na seq�ncia certa.
Bjos.

sabina anzuategui disse...

Sim, há outra referência a esse sentimento mais à frente. Mas talvez a frase seja redundante, ainda tenho dúvidas.
Quanto ao lançamento... espero publicar, mas o processo é longo. Estou preparada para esperar uns 2 anos, administrando minha angústia.