quarta-feira, 16 de abril de 2008

Transtorno bipolar

Estou completamente obsessiva. Só fui reler o texto para mandar a uma amigo e comecei a revisar e passou mais de uma hora e são onze e meia e preciso fazer o check-out no hotel ao meio-dia.

Não terminei de revisar e não posso mais escrever.

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Estou num hotel no centro do Rio de Janeiro. Esqueci de trazer qualquer tipo de papel branco então preciso sair e procurar uma papelaria. Mas está chovendo. Antes de atravessar a rua procuro um camelô com sombrinhas. Apesar de ser o Rio de Janeiro não vejo nenhum. Caminho dois quarteirões me escondendo sob marquises, o vento está forte, até que encontro um garoto que pergunta se quero um taxi e quando digo não, quero uma sombrinha, ele chama um velho coberto com uma lona preta que me leva até uma barraca de presilhas e elásticos de cabelo e a mulher gorda tira uma sacola debaixo da bancada e ali há os guarda-chuvas. Mas o velho avisa que só tem de cinco reais. Olho o vento, não vai aguentar, mas como eu poderia sair debaixo daquele céu sem proteção? Mas a sombrinha não protege nada enquanto demoro para atravessar porque não conheço os semáforos, a avenida tem duas pistas e o sinal fecha quando estou na canaleta, não conheço a cidade nem a personalidade dos motoristas, não tenho coragem de passar entre os carros andando, um homem passa e me sinto uma covarde. A chuva não é tão forte mas é o vento, minha perna quase toda molhada. Entro na papelaria: peço uma caderneta, vejo outro guarda-chuva mais forte de doze e noventa, pergunto onde tem uma lan-house ali perto. A caderneta nem seria necessária se eu pudesse escrever direto no computador, mas na dúvida compro e procuro, a caderneta é bonita, é lilás e tem uma flor. A moça de avental me indica a esquina da rua Santa Luzia com a Graça Aranha, mais quatro quarteirões, posso dobrar à esquerda na igreja para me localizar, ela diz. Chego lá e não vejo nada. Tenho medo de perguntar para que não percebam que não sou da cidade e não me assaltem, mas vou e volto pelo mesmo trecho e isso vai dar ainda mais na cara, então pergunto. O vendedor de fones de ouvido aponta a loja que seria do outro lado da rua, mas não existe mais, é um posto de serviço da Nokia. Continuo andando e tentando descobrir pessoas que não pareçam perigosas para perguntar, será que existe mesmo outra lan-house, em quase todas as quadras só vejo prédios do governo, talvez nessa área não haja comércio pequeno. Uma hora de internet no hotel custa dezesseis reais. Gastei mais com os dois guarda-chuvas, mas eu precisava sair, de todo jeito, porque também não quero pagar três reais por meio litro de água no frigobar. Antes de atravessar a rua e comprar o primeiro guarda-chuva, a mulher da banca de jornal havia me indicado um mercadinho e pensei além da água também em comprar algum pão para jantar. Mas ninguém sabe de nenhuma lan-house, ninguém usa internet nesse centro? Todos esses pobres andando na rua, eles não precisam de lan-houses para entrar no orkut porque não têm dinheiro para ter computador em casa? Com tantos pobres precisaria haver uma lan-house, pelo amor de deus. Continuo andando, estou andando realmente rápido e as ruas estão cheias de poças, é difícil ver o que há na frente por causa dos guarda-chuvas meu e de todos os outros pobres como eu, uma vez a mulher do meu chefe disse que nunca mais usou guarda-chuva depois que comprou um carro, porque para ela guarda-chuva é coisa de quem não tem carro. Era melhor desistir. Resolvi voltar para o hotel porque dezesseis reais ao final não era tanto, o Teatro Municipal estava lindo à minha frente, mas era absurdo eu estar ali toda molhada porque eu tenho dezesseis reais, eu posso pagar a água do frigobar, eu não precisava ter saído do hotel para começo de conversa. Mas eu não consigo me controlar: não é só a quantidade de dinheiro, eu também não quero dar dezesseis reais para aquele hotel porque uma hora de internet não vale isso, não vale. Apesar do meu estado lamentável e da humilhação daquela chuva e daquela cidade barulhenta e cheia de ônibus pintados de faixas amarelas e azuis que não combinam de jeito nenhum eu pergunto a um último careca mal humorado demais para aquela cara bem alimentada que mal aparenta trinta anos. Parece que ele não quer responder e demora para dizer de má vontade que talvez na Treze de Maio, só voltando, depois do Teatro Municipal, ele não sabe e não quer saber, eu que vá lá se quiser. Informação antipática e voluntariamente desvalorizada mas se eu segui a moça boazinha da papelaria que estava errada eu vou agora também. E agora estava certo. Havia andaimes porque o prédio estava em reforma, e o dono tem sotaque argentino, mas o computador está aqui.

De todo modo eu precisava andar. Porque estou acima do peso e meu equilíbrio emocional não é dos melhores por isso preciso fazer exercício e o hotel não tem sala de ginástica.

4 comentários:

Anônimo disse...

Você se parece comigo. Se eu mostrar esse texto para a minha mãe, ela vai dizer que fui eu que escrevi. rs.
Beijos.

sabina anzuategui disse...

Se eu mostrar esse texto para minha mãe, ela vai ficar preocupada e perguntar se estou tomando meus remédios direitinho.

Rachel Souza disse...

Nossa, quanto perrengue!!rs
Mas no Rio é assim, uma vez perguntei pro motorista de ônibus onde ficava uma rua de um bairro por onde ele passava e ele disse não saber! Devia ser autista ou autômato,coitado!rs

sabina anzuategui disse...

Ou então, como dizem os cobradores em SP: "eu sou novo na linha".