segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Paul Auster, Sunset Park

"Sunset Park", romance de Paul Auster lançado em 2010 (tradução brasileira de Rubens Figueiredo, 2012), é o livro que eu precisava ler. Talvez Auster, agora velho, seja o escritor que me faltava pra substituir a lembrança de Peter Handke em "Bem aventurada infelicidade" (Wunschloses Ungluck).

Nunca li "Trilogia de Nova York", talvez tenha tentado tarde demais (depois de certa estrada, perdi a paciência para alguns recursos de estilo).

Auster velho escreve melhor. E "Sunset Park" me faz perceber como é rasa a divisão da narrativa entre "cena" e "exposição", cena e digressão, ou coisa que o valha. Ele quase não compõe cenas. Ao mesmo tempo, não se afasta da cena, a narração é restrita ao contexto de cada situação. E como é elegante ao escrever em terceira pessoa. Elegante como um relatório. "Já faz quase um ano que ele tira fotografias de coisas abandonadas". Pronto, o livro começa. Sem efeitos sensoriais, sem adjetivos pomposos ou irônicos em lista de três (ah, porque os escritores raramente se contentam com um adjetivo apenas).

Substantivos e adjetivos retumbantes, somente quando convêm ao personagem (às vezes ironicamente, às vezes de modo emotivo). Assim, Bing Nathan é apresentado. "Ele é o guerreiro da revolta, o campeão do descontentamento, o militante do desmascaramento da vida contemporânea, que sonha em construir uma realidade nova das ruínas de um mundo falido".

Admiro a simplicidade com que resume alguns diálogos em parágrafos narrativos. E como consegue indicar "lembra", "relembra", "pensa", sem parecer que injeta frases a seringa no cérebro dos personagens.

Ótima tradução, provavelmente (não li o original). O livro necessário para me aliviar da opressão de escrever em forma de cenas, porque não sou suficientemente filósofa para escrever digressões, e não conseguia visualizar opções intermediárias. Agora eu entendo: parágrafos longos; economia de aspectos visuais (somente detalhes; pinceladas); diálogos importantes alinhados em pontuação normal, sem aspas, ao longo do parágrafo; alternância sem hierarquia de falas, pensamentos, lembranças, imagens da cena. Sem hierarquia mas sem confusão, situando o que precisa ser situado, sem cacoete. Pode-se dizer "lembra", quando necessário, se a informação for objetiva e evitar a sensação de texto-enigma (decifra-me pois sou refinado).

2 comentários:

Paulodaluzmoreira disse...

Aqui tem muita gente que implica muito com ele, Sabina. Mas a sua análise do estilo me deu vontade de voltar ao escritor. O diabo é a falta de tempo. Vc sabia que ele foi casado com a Lydia Davis? Um casal de peso: acho ela uma escritora estupenda!

sabina anzuategui disse...

Eu também implico um pouco. Tem uns cacoetes temáticos (baseball, por exemplo), certa repetição de personagens, etc.

E o livro tem páginas ruins, alguns efeitos simplórios, alguns temas "do momento" transcritos meio diretamente, como se fosse um panfleto, não um romance.

Mas esses defeitos ajudam a aproximar o livro de um estilo "possível", pois livros bons demais às vezes bloqueiam a gente.