Um trecho de "A história de Vidal, meu pai", de Edgar Morin. Li este livro com carinho, porque o pai do cabrito também tinha uma loja no bairro do Sentier, em Paris, desde a segunda guerra. Pensei que minha amiga Si poderia se interessar.
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"Em contraste com a rue des Rosiers, então colonizada pelos asquenasitas da Polônia e da Rússia, nenhum exotismo, nenhuma moda ou estilo de vida, nenhum sinal - salvo os nomes dos lojistas e o empilhamento sem graça das mercadorias entrepostas atrás das vitrines - indica ao olhar exterior a presença de uma comunidade estrangeira. A população é, de fato, muito mesclada; restam ainda as camadas populares parisienses, nos quartos de último andar e nos cubículos dos zeladores; os representantes comerciais que visitam o bairro são franceses, os lojistas são majoritariamente sefaraditas, os clientes se compõem de uma minoria de franceses, muitos metecos, feirantes e pequenos lojistas do interior ou da periferia, norte-africanos, armênios, asquenazitas.
(...)
A loja era, a bem dizer, uma lojinha bem estreita. Nos mostradores da vitrine, misturadas, empilhadas e desorganizadas, meias e meias-calças amarradas em dúzias. Uma longa mesa central retangular divide a loja em duas passagens simétricas estreitas. Vidal costuma ficar do lado esquerdo, os clientes do lado direito, mas eles vêm ao lado esquerdo para observar, manusear, estender as meias e meias-calças que, às dúzias, se empilham em escaninhos de um lado e do outro, até o teto.
(...)
Na verdade, Vidal não se interessa por meias ou meias-calças, interessa-se por seu negócio. É aí que coloca toda a sua energia, mas não adquiriu o senso das texturas, dos materiais, das cores; deixa-se guiar pelos pedidos dos compradores, pelas indicações dos fornecedores: "isto agrada muito, no momento". Sua incompetência condena-o aos fins de séries, às escolhas de segunda, às liquidações, e esses fins de série, essas escolhas de segunda, essas liquidações alimentam sua incompetência. Aliás, guardará em estoque, durante mais de dez anos, meias-calças de cores horríveis, meias pavorosas: só a ocupação alemã de 1940, com suas restrições e sua escassez de mercadorias, permite-lhe escoar, a bom preço, o invendável."
Um comentário:
Edgar morin? bom! Já volto pra ler.
Bjos!!
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