Acordei provavelmente às três da manhã, depois de um sonho sobre sucos, sopas e o medo de ter a casa invadida, e um hábito secreto em relação a algo que não lembro, dirigindo carros antigos em alta velocidade e batendo de propósito contra o muro, e minha mãe descobre o segredo e eu viro um homem que foge, e numa curva perde a direção do carro - uma peça escapa do motor, e quando tento alcançar a peça eu acordo.
Não consegui voltar a dormir, e depois de alguns pensamentos soltos tentei lembrar dos meus últimos períodos de euforia, com medo que o ciclo começasse de novo. Mas não consegui me concentrar e lembrei apenas da última depressão, que começou no início de junho.
Aos primeiros sintomas pensei que era uma tristeza e iria passar. Mas meu estado piorou em agosto. Não fiz nada na terça-feira porque era aniversário do meu marido e pensei que ele ficaria muito triste se eu me suicidadesse nesse dia.
Na quinta-feira fui ao hotel Formula 1 e perguntei no balcão se havia um quarto no sétimo andar, pois o barulho da rua me incomodava. Só havia algo livre no décimo primeiro. Achei que seria alto demais, mas ainda assim entreguei meu cartão de crédito e assinei o recibo que o funcionário me entregou. Não acendi a luz quando entrei no quarto. Deixei a bolsa sobre a cama e abri a janela, mas havia uma haste metálica parafusada à base. O vidro só se afastou dez centímetros da parede. Desci até a Rua da Consolação e caminhei até uma loja de luminárias. Perguntei se vendiam chaves de fenda, mas responderam que não. Na terceira loja me indicaram uma casa de materiais de construção na esquina da Alameda Santos. Atravessei a rua. Havia muitos carros e naquele momento eu preferia não ouvir nenhum barulho. A chave de fenda custou doze reais e eu voltei para o hotel.
Tive que soltar seis parafusos. Enquanto estava claro quase tive coragem. Mas foi difícil encarar o abismo debaixo da janela depois que anoiteceu. No escuro, a distância parecia maior.
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