quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Resistir à asfixia

Ontem terminei a revisão do "Afeto". Vou passar a limpo e está pronto, espero. Quero enviar a alguns amigos para colher opiniões, se alguém se interessar - um interesse sincero em ler e comentar - posso enviar uma cópia pelo correio.

No fim das contas não existe nenhuma "maldade" na narradora, como tentei construir. Me parece tudo muito triste, é estranho dizer isso de uma coisa que eu mesma escrevi, mas foi o que senti. Terminando de ler só pensei: por que escrevi uma coisa tão triste?

Segue o trecho de um capítulo novo, que não estava nas versões anteriores. Talvez seja o climax da história.

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"Abri a porta e Juliana ficou no corredor. Andei rápido até a sala. Minha mãe estava no sofá com o cabelo molhado, enrolada numa toalha quase solta, chorando convulsivamente, deixando à vista um seio nu. Um seio pequeno e murcho.

O rosto vermelho e inchado, todo molhado de lágrimas, testa enrugada, lábio vincado contra o queixo. Arfava como se estivesse afogando, não um gemido fino mas um choro grosso de ar tentando resistir à asfixia, à asma, ao estrangulamento. Seus pés nus estavam roxos pelo frio, a pele azulada na curva dos ossos. Não me olhava, não olhava parte alguma. Apenas tentava se cobrir com a toalha, agarrando os dedos no tecido com a mão crispada, comprimindo os braços contra o peito."

4 comentários:

Unknown disse...

Então você é a Sabina que a Renata fala tanto... prazer, sou amigo dela e tenho uma revista de humor que acaba de virar sáite, visite lá se lhe apetecer: jararacaalegre.com.br. Posso te ler aqui de vez em quando?
abraço
camilo

Paulodaluzmoreira disse...

Sabina,
Este trecho está muito bom – gostei demais da concentração detalhista da narradora em primeira pessoa [que poder de observação!] nesse momento tão emotivo. Digo isso sem nem saber qual é a natureza da relação entre mãe e filha, o porquê do choro, nada. Não sei bem como é a história e por isso me veio uma idéia estranha: que micro-conto genial esse trecho não daria! Exatamente pelo tanto que ele deixa sugerido. Parabéns!

sabina anzuategui disse...

Paulo, a cena seria um tanto sentimental, por isso tentei descrever de um modo cru e horrível. Para não criar piedade e sim alguma aversão. Não sei se você sentiu assim. De todo modo isso sempre me impressionou: o modo como as pessoas se transfiguram quando choram.

Paulodaluzmoreira disse...

Acho que vc conseguiu exatamente o efeito que vc queria. E eu tbm acho importante e corajoso que um escritor enfrente essas cenas "sentimentais" [que afinal fazem parte da experiencia humana] sem precisar apelar para o dramalhao ja que o drama por si so ja e poderoso o suficiente. Depois realmente qdo a gente chora assim, fica mesmo grotesco. Muito bom.